quinta-feira, 21 de julho de 2011

Sonhos para vestir.

Quando entrei na sala de teatro estava impaciente, com a sensação de que alguém havia me obrigado a estar ali, no caso, esse alguém era eu mesma. Confesso, sempre tenho essa sensação, um certo receio de que o espetáculo seja chato, me canse e desamine, somado a isso a gravidez. A gravidez não é uma desculpa para ser chata, mas nos deixa mais sensíveis, e os sentimentos, tanto os bons quanto os ruins ficam aflorados. Enfim, entrei no teatro com vontade de sair, mas me permitir estar ali. Concentrei minha atenção no músico que tocava um acordeão, comecei a perceber o cenário, na verdade, uma instalação, um imenso pano branco no fundo do palco pendurado em uma vara de ferro que servia de lençol para atriz deitada no chão de costas para o publico, um carretel com linha de algodão branca, um pequeno espelho, dois copos de alumínio, uma bacia com uma jarra sobre ela e um baú, todas essas coisas despretensiosamente organizadas, as luzes penduradas me lembravam estrelas, elas estavam envolvidas em tecidos de algodão cru. Me envolvi com o ambiente, mas ainda não totalmente. A música parou, a personagem então acordou e de repente em mim novamente a vontade de buscar algo para me agarrar e ficar ali, e meu pensamento era, ah meus deus palavras e mais palavras que serão jogadas e mais uma história egoica, onde o artista fala de si para si!Também pensei: como estou chata! Mas esses pensamentos passaram de forma rápida, pois também de repente, me vi envolvida pelas palavras que a atriz/personagem dizia. Essas palavras começaram a tomar forma dentro da minha cabeça, dando-me imagens tão bonitas e delicadas, resgatando lembranças distantes, escondidas no tempo e no espaço de antigamente, mas ainda vivas em meu corpo e alma. A história era dela, mas foi se transformando também na minha e ao olhar para as pessoas em minha volta senti que ali elas também se reconheciam e recontavam suas lembranças e memórias. Através da palavra poema, ou do poema que se faz com a vida a atriz/personagem me levou pra rua de calçamento onde eu corria a tarde inteira, aos muros e árvores que subia para brincar, ao primeiro livro que li só, "Bulunga: O Rei Azul." A palavra poema também me levou a praia da adolescência, das descobertas e dores, dos desejos e das rejeições, do por-do-sol em cima de uma falésia e do nascer da lua no mar.
Então, uma história simples de amor entre pai e filha e dos presentes dados por este pai a menina: as palavras, contada de forma delicada e sensível transformou meu espirito, meu corpo e minha alma. E ali naqueles instantes de resgate das lembranças queridas me fiz presente e futuro, ouvi o que ela dizia, mas pensei sobre os meus sonhos e desejos que se transformam a medida em que minha barriga cresce e ganho a dimensão de que um ser humano se desenvolve dentro de mim.
Vesti os sonhos numa noite de encontros com Sara, comigo e com Pietra.